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sábado, 9 de abril de 2016

Juízes sob ameaça

Por que está aumentando o número de magistrados vítimas de agressão física, pressão psicológica e perseguição no País

Fabíola Perez (fabiola.perez@istoe.com.br)
Em São Paulo, a juíza Tatiane Moreira Leite foi rendida por um homem, dentro de um fórum na Zona Oeste da cidade, que ameaçou atear fogo em seu corpo. No Rio de Janeiro, a magistrada Daniela Barbosa Assumpção de Souza teve a roupa rasgada e perdeu os óculos e os sapatos em uma visita ao presídio que fiscalizava. Em Bangu (RJ), o juiz Alexandre Abrahão ficou sob a mira de bandidos que invadiram o fórum para assassiná-lo. Odilon de Oliveira é um dos magistrados mais ameaçados do País e coleciona uma série de planos para matá-lo. Eles fazem parte de um grupo de 202 magistrados que já sofreram ameaças de violência física ou psicológica no País. Os dados são de uma pesquisa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e servem de termômetro para mostrar que está ficando cada vez mais perigoso ser magistrado no Brasil. Mesmo com um forte esquema de proteção, o aumento da criminalidade em algumas regiões e a falta de mecanismos de segurança em fóruns são os grandes responsáveis pelos ataques violentos e crescentes a esses profissionais.
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INSEGURANÇA
A juíza Daniela Barbosa Assumpção de Souza, que teve a roupa rasgada 
durante uma visita a um presídio em Benfica, na Zona Norte
No dia 30 de março, a juíza Tatiane Moreira Lima, 37 anos, viveu os 30 minutos mais angustiantes de sua vida quando foi mantida como refém de um homem que ameaçava incendiá-la com um líquido inflamável e um isqueiro. O vendedor Alfredo José dos Santos, 36 anos, chegou a exigir que a cena fosse filmada na Vara de Violência Doméstica, do Fórum Regional do Butantã, em São Paulo. Réu na ação de agressão contra a ex-mulher e enquadrado na lei Maria da Penha, o agressor considerou Tatiane culpada por ter tirado a guarda do filho. Com isso, o vendedor arquitetou um plano para invadir o fórum correndo e passar pelos seguranças com uma mochila, munido de garrafas com líquido inflamável. Quando os guardas chegaram à sala da magistrada, ele já a segurava pelo pescoço e havia despejado o produto químico.
Um dia após a agressão, Tatiane disse que não deixaria de trabalhar em decorrência da violência. “Não vou deixar que um maluco impeça que eu faça o trabalho que amo tanto”, afirmou. “Não tenho sentimento de rancor nem de raiva, vi ali um ato de desespero, percebi que eu estava sendo vítima de violência assim como as minhas vítimas que vêm todos os dias nas audiências.” A Associação Paulista de Magistrados reforçou o pedido de mais proteção contra atos que atentem contra membros da magistratura. “O juiz está inserido no contexto social, no aumento da criminalidade organizada e isso se reflete na atuação do magistrado que trabalha em cima de conflitos e litígios”, diz Fernando César Baptista de Mattos, presidente do Comitê Gestor de Segurança do CNJ. “É preciso melhorar no controle de acesso aos fóruns, adotar um circuito fechado de televisão, contratar uma guarda própria e investir em um trabalho de segurança preventivo.” 
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ATAQUE 
Acima, o magistrado Odilon de Oliveira, que só anda com colete à prova de balas. 
Abaixo, Alexandre Abrahão Dias Teixeira, na mira dos criminosos desde 2005
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Há seis meses, outro caso de agressão recaiu sobre mais uma magistrada. A juíza Daniela Barbosa Assumpção de Souza foi hostilizada durante uma fiscalização no Batalhão Especial Prisional, em Benfica, na Zona Norte. Ela teve a roupa rasgada, perdeu os óculos e os sapatos. “Eles me cercaram e minha escolta me defendeu, o clima estava muito tenso”, disse. De acordo com as investigações, os autores da agressão foram policiais militares acusados de integrar uma milícia, tanto que o juiz titular da Vara, Eduardo Oberg, determinou o fechamento do Batalhão e a transferência de todos os policiais.
As ameaças e tentativas de assassinato deixaram marcas na vida do juiz Alexandre Abrahão Dias Teixeira, de 48 anos. Ele teve de abandonar atividades corriqueiras como frequentar restaurantes, shows e planejar viagens. Um dos mais perseguidos do País, Teixeira está na mira de criminosos desde 2005, quando assumiu como titular da Vara Criminal de Bangu. A região em que atuava é conhecida por viver sob o domínio das organizações Comando Vermelho, Amigo dos Amigos e Terceiro Comando Puro. “Minha vida se tornou um inferno”, diz. Teixeira lembra um dos dias mais tensos de sua trajetória: em 2013, o Fórum de Bangu foi invadido para resgatar dois presos e assassiná-lo. Na ação, morreram um garoto de oito anos e um segurança da escolta, ambos alvejados por tiros de um fuzil. O magistrado, que até hoje é amparado por uma equipe de seis seguranças e possui carro blindado, conta que recebe ligações, cartas com fotos de familiares e é informado de planos malsucedidos para assassiná-lo. “São promessas eternas de perseguição.”
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PÂNICO 
Tatiane Moreira Leite, mantida refém por um homem que ameaçava incendiá-la dentro do fórum
Um dos primeiros juízes federais que teve de recorrer aos serviços de segurança permanente foi Odilon de Oliveira. O magistrado recebe ameaças há mais de 20 anos e conta com a proteção de escolta policial há 13. Ele sempre atuou em estados localizados em áreas de fronteiras, conhecidos por fazerem parte da rota do narcotráfico, como Mato Grosso, Rondônia e Mato Grosso do Sul. Além da escolta policial, Oliveira utiliza colete à prova de balas para trabalhar e anda em carros que suportam até tiros de fuzis. “Não faço absolutamente nada sem proteção”, diz. Tudo isso porque, em 24 anos de carreira, diz ter condenado mais de 200 traficantes e confiscado bilhões de reais do crime organizado. “Minha liberdade ficou restrita.”
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Foto: Marcia Foletto/Ag. O Globo; Paulo Ribas; Masao Goto Filho/Ag. Istoé; GABRIELA BILO/ESTADÃO
Publicado originalmente em: http://www.istoe.com.br/reportagens/450540_JUIZES+SOB+AMEACA

sábado, 5 de abril de 2014

Assédio de toga

Dos juízes espera-se equilíbrio, serenidade e, sobretudo, justiça nos atos e tomadas de decisão. Parte dos servidores do Poder Judiciário, porém, tem se deparado com magistrados autoritários e prepotentes, que perseguem e assediam moralmente os funcionários. Uma pesquisa inédita no País, realizada pelo Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro e obtida por ISTOÉ, é um indicador do ambiente ruim dos tribunais brasileiros. A enquete revelou que 44,5% dos servidores do Tribunal de Justiça do Estado entrevistados afirmam já ter sofrido algum tipo de assédio moral. “Começamos a perceber um número cada vez maior de servidores afastados por problemas psicológicos”, afirma Alzimar Andrade, coordenador-geral do Sind-Justiça. “Esse quadro é agravado porque os juízes assediadores se sentem em uma classe superior, repleta de poder, e têm uma espécie de garantia de não punição.” O levantamento também apontou que 45% dos funcionários ouvidos disseram que já foram ofendidos ou humilhados no atendimento a advogados ou a partes de um processo (leia abaixo).
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O assédio no serviço público tem peculiaridades. Em uma empresa privada, o chefe descontente pode demitir o trabalhador, algo que não ocorre com funcionários concursados. “O que se negocia são os benefícios e a independência interna do servidor”, afirma o professor de sociologia do direito da Fundação Getulio Vargas (FGV) do Rio de Janeiro Fernando Fontainha. Isso permite, por exemplo, a perseguição de um profissional até que ele decida se exonerar da vida pública. Frequentemente, trava-se uma guerra judicial entre as partes, como ocorreu com a funcionária do Tribunal de Justiça de Minas Gerais Flávia Felício Silva, 42 anos. Ela afirma ter sido perseguida pelo juiz Roberto Ribeiro de Paiva Júnior enquanto trabalhou como escrivã judicial na Comarca de Uberlândia em 2007. “Além do meu trabalho, eu era obrigada a fazer despachos para o juiz, que é atribuição dos estagiários, e trabalhava das 7h às 22h”, relata. Flávia conta que engordou 30 quilos em quatro meses e, quando chegou ao limite, foi conversar com o juiz. “Ele disse que ninguém falava ‘não’ para ele e que eu veria quem mandava”, conta.
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BATALHA
Flávia e o juiz Roberto Ribeiro de Paiva Júnior travaram uma guerra judicial:
ele entrou com cinco processos administrativos contra ela e todos foram arquivados
Naquele momento, segundo Flávia, os maus-tratos vieram à tona. Ela foi proibida de entrar no gabinete de Paiva Júnior. “Eu ouvia dele que eu fedia e era gorda e irresponsável”, diz. Por ter cometido uma falha em um processo que resultou em prejuízo financeiro para as partes, ela tomou uma suspensão de cinco dias. Diante disso, a servidora entrou com um mandado de segurança contra o juiz e a atitude do magistrado foi considerada inconstitucional pelo TJ-MG. O caso virou uma disputa judicial. Flávia fez uma representação contra Paiva Júnior na Corregedoria-Geral do Estado e o juiz entrou com cinco processos administrativos contra ela, todos arquivados. A Corregedoria, por sua vez, determinou que o juiz a tratasse com dignidade. Em 2009, Flávia foi transferida de vara. Procurado por ISTOÉ, o Fórum de Uberlândia informou que o juiz está de férias.
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Tratamentos humilhantes repetitivos podem comprometer a identidade, as relações afetivas e a capacidade de se adequar ao ambiente de trabalho, muitas vezes sem que a pessoa tenha consciência. No Rio de Janeiro, o caso da oficial de Justiça Márcia Elisa Barroso, 38 anos, chegou ao extremo. A funcionária atirou-se do sexto andar do seu prédio, em novembro passado, após ter sido removida de local de trabalho contra a sua vontade, o ápice de uma série de problemas, segundo ela. Márcia fazia parte de um grupo de 12 servidores que, em 2011, abriu um processo administrativo para denunciar o assédio moral praticado pela chefia da Central de Mandados do Fórum de Alcântara, em São Gonçalo, e pedir remoção coletiva. “Todos sofriam com o tratamento da diretora da Central e a juíza nos acusava de fazer motim”, diz. Segundo Márcia, o tempo era restrito para cumprir o número de mandados exigidos, a diretora colocava os funcionários uns contra os outros no momento de definir plantões e quando alguém não dava conta do trabalho ela humilhava e gritava com a pessoa na frente de toda a equipe.
Em julho de 2012, Márcia passou a trabalhar em Niterói, mas em novembro passado foi novamente transferida para São Gonçalo. “Entrei em profunda depressão”, diz ela, que não se lembra direito do dia em que resolveu pular da janela. A servidora sofreu traumatismo craniano, uma série de fraturas, ainda está de licença médica e atualmente precisa de um andador para se locomover. O TJ-RJ nega que tenha havido assédio moral. A juíza Renata de Souza Vivas Pimentel, da Central de Mandados de Alcântara, afirmou que a remoção ocorreu em razão da abertura de um presídio na região, o que aumentaria a demanda de trabalho no Fórum local.
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GRUPO
Márcia e outros 11 servidores abriram um processo administrativo para
denunciar o assédio moral praticado no Fórum de Alcântara, em São Gonçalo (RJ)
No Poder Judiciário, a disparidade de forças parece mais evidente. “O servidor vive um embate com uma pessoa que possui muito mais poder”, diz Roberto Dias, professor de direito constitucional da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). “Assim, quando o funcionário vai atrás de seus direitos, ele corre o risco de ser malvisto pelos outros juízes e prejudicar a continuidade de sua carreira pública.” A chefe de cartório Nara Pereira, 52 anos, hoje trabalha em Criciúma (SC), mas ainda teme que sua carreira seja prejudicada pelo juiz Lírio Hoffmann Júnior, com quem trabalhou no Fórum de Orleans (SC). Em 2012, ela apresentou uma representação contra ele na Corregedoria-Geral do Tribunal de Justiça do Estado, alegando maus-tratos e perseguições no ambiente de trabalho.
Os desentendimentos começaram logo no início da relação profissional. “Ele começou a incitar os estagiários contra mim e a me desautorizar diante deles. Também queria que eu o ajudasse a prejudicar seus desafetos”, conta. “Percebi que se tratava de assédio moral quando fui trancada em uma sala e uma servidora falou que eu estava sendo observada.” Nara relata ainda que a funcionária lhe disse que sua função era dar andamento nos processos para acelerar a promoção do juiz. Na denúncia à Corregedoria, Nara acusou Hoffmann de ameaçar abrir uma ação administrativa contra ela, o que de fato ocorreu. De acordo com o desembargador do TJ-SC, Ricardo Roesler, a representação aberta por Nara foi “arquivada por inconsistência de provas e o processo disciplinar continua em tramitação na presidência do Tribunal de Justiça”. Hoffmann afirmou desconhecer alegações sobre assédio moral. “Nossa relação de trabalho era boa, mas não posso dar mais informações sobre o que motivou o processo administrativo”, disse o juiz.
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Numa área célebre pela morosidade e com uma demanda de maior rapidez da sociedade, as disputas tendem a se acentuar. “O índice de servidores públicos com problemas de saúde é cada vez mais elevado”, diz Paulo Blair de Oliveira, professor da Universidade de Brasília (UnB) e juiz do trabalho há 20 anos. “Por que o tema assédio se tornou tão premente agora? Porque a sociedade exige uma solução com velocidade digital para as suas solicitações e o Judiciário ainda trabalha em ritmo analógico.”
Foto: Kelsen Fernandes/Ag. Istoé; L. Adolfo
Fonte: http://www.istoe.com.br/reportagens/356117_ASSEDIO+DE+TOGA?pathImagens=&path=&actualArea=internalPage

domingo, 2 de dezembro de 2012

Juízes sob tutela

Ministra Eliana Calmon, diretora da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados

Ex-Corregedora nacional de Justiça, a ministra Eliana Calmon promete causar barulho no comando da Escola Nacional de Magistrados (ENFAM). Quer um curso de reciclagem para desembargadores e um intensivo para juízes estaduais sobre os poderes em Brasília. "O juiz é um agente político, temos que abrir a cabeça dele para o País", diz.

Fonte: Istoé

sábado, 3 de novembro de 2012

Vida em xeque: 182 juízes brasileiros vivem sob ameaça


Sem aparições públicas. Vida restrita ao convívio familiar. Com deslocamento vigiado. Privados do direito básico de ir e vir. Essa é a rotina de quase 200 magistrados brasileiros, acossados pelo crime organizado. Em alguns casos, por quadrilhas integradas por policiais e outros servidores públicos. Em outros, por facções gestadas dentro do sistema penitenciário, como o paulista Primeiro Comando da Capital (PCC).
Em Porto Alegre, a juíza Elaine Canto da Fonseca recebeu um recado desde uma prisão: deveria soltar presos que seriam julgados por ela. Como se recusou, se desloca desde o início do ano em carro blindado. Em Mato Grosso do Sul, o juiz federal Odilon de Oliveira convive com nove agentes federais de escolta, inclusive dentro de casa. Em Goiás, o juiz federal Paulo Augusto Moreira Lima pediu afastamento do processo que conduzia contra o bicheiro Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, após receber ameaças. Cabia ao magistrado analisar denúncias contra 79 réus supostamente vinculados ao bicheiro, entre eles 35 policiais. Em Rondônia, o juiz trabalhista Rui Barbosa Carvalho passou a usar colete à prova de balas e trocou de celular 12 vezes, em decorrência de ameaças recebidas após suspender pagamento de precatórios por suspeita de fraude.
Casos como esses foram discutidos em 8 de outubro num encontro de magistrados promovido em Manaus. O debate foi uma iniciativa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que contabiliza este ano 182 juízes ameaçados no país. Desses, apenas 60 contam com escolta.
Esse tipo de levantamento começou a ser feito em 2011, logo após o assassinato da juíza fluminense Patrícia Acioli, morta com 21 tiros em 11 de agosto daquele ano. Investigações concluíram que ela foi executada por PMs que tinha mandado prender, por integrarem milícias clandestinas.
Logo após a morte de Patrícia o CNJ contabilizou 150 juízes brasileiros ameaçados. Mesmo com toda a comoção causada pelo assassinato da magistrada, o número aumentou, passando aos atuais 182. Antes restritas a magistrados criminais, agora a lista dos que estão na mira do crime inclui também juízes trabalhistas, justamente pelas milionárias causas que costumam julgar e os interesses que contrariam.
Zero Hora obteve uma listagem do número de ameaçados por Estado, feita com base em relatórios dos Tribunais de Justiça (veja nesta página). Os campeões em magistrados jurados de morte em 2012 são Rio de Janeiro, com 29 ameaçados, e Minas Gerais, também com 29. Alguns Estados com pequena população, como Tocantins e Alagoas, surpreendem pelo número de magistrados em risco: 12, cada. Apenas cinco Estados brasileiros não informam terem juízes ameaçados.
Diante desses números, o Rio Grande do Sul até parece um paraíso. Apenas duas juízas requisitaram proteção este ano. E foram contempladas com escolta.
— Felizmente, não temos tradição de riscos e muito menos de ataques contra magistrados. E contamos com um Núcleo de Inteligência do Judiciário para prevenir esse tipo de problema — explica o desembargador Tulio Martins, do Conselho de Comunicação Social do Tribunal de Justiça-RS.
Dão apoio ao núcleo policiais militares, policiais civis e agentes de segurança do Judiciário. Entre as providências rotineiras está levantamento de possíveis inimigos dos juízes. Numa fase posterior, propiciar escolta e carro blindado para qualquer magistrado sob risco, além do presidente do TJ, sempre protegido.
O presidente da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris), Pio Dresch, diz que nem todos os casos chegam ao conhecimento do CNJ. Um deles é suposta contratação de pistoleiros para matar um juiz do Interior, que acabou tirando licença para "esfriar" a ameaça.
— Um dos problemas que enfrentamos é que, devido à escassez de magistrados, não é possível simplesmente transferir o juiz para outra comarca, o que seria razoável. É preciso abrir vaga antes. A verdade é que falta uma sistemática para lidar com magistrados em risco — desabafa Dresch.
O presidente da Ajuris considera que uma alternativa para as constantes ameaças de morte seria implantar no Brasil os "juízes sem rosto". São magistrados que teriam seus nomes ocultados nos processos que julgam, para sua própria proteção. O sistema funcionou na Colômbia durante os Anos 90, época do auge das guerras do narcotráfico naquele país.
Revista Consultor Jurídico, 3 de novembro de 2012

terça-feira, 6 de março de 2012

APOSENTADORIA COMPULSÓRIA: PUNIÇÃO OU CRIME


Por Ophir Filgueiras Cavalcante Júnior
Presidente Nacional da OAB

As recentes e pedagógicas decisões do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), de afastar magistrados que deixaram de observar os mais elementares deveres funcionais e incorreram em práticas de corrupção e malversação de dinheiro, demonstram a maturidade alcançada por esse importante órgão de controle externo. Ao mesmo tempo, levam-nos a refletir acerca da aposentadoria compulsória concedida a magistrados e membros dos Tribunais de Contas envolvidos com essas situações. No mínimo, despertando certo grau de perplexidade.

Como está expresso no título acima, é castigo ser aposentado e continuar a receber em casa proventos pagos com recursos públicos após cometer esses crimes? Ou terá sido uma bênção? Em busca de uma resposta digerível, não é à toa que o tema tenha se inserido no Parlamento, a partir de Proposta de Emenda Constitucional apresentado pela Senadora Ideli Salvatti (PEC nº 83/09) e que está prestes a ser analisado no Senado.
Ao decidir dessa forma, o CNJ nada mais fez do que seguir a “penalidade” prevista no inciso VI do art. 42 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional e Lei Complementar nº 35/79. Editada em um momento singular das instituições, a chamada Loman procurou preservar a independência e autonomia dos integrantes do Poder Judiciário contra atos arbitrários do passado. A realidade hoje é outra.
O magistrado age com total liberdade e tem a seu favor o preceito constitucional que lhe confere o direito à vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos (art. 95 da Constituição Federal) – justamente os obstáculos à punição daqueles que incorrem em faltas graves no exercício de suas atividades.
Esses obstáculos se apoiam em dois pilares: 1. a vitaliciedade só pode ser afastada por sentença transitada em julgado; e 2. a previsão da aposentadoria compulsória, ou seja, direito à percepção dos subsídios integrais ou proporcionais (dependendo do tempo de serviço), autorizado pelo disposto no art. 93, VIII, da Constituição Federal em conjunto com o contido no inciso VI do art. 42 da Loman.
De fato, a previsão em causa não encontra base racional lógica. É, antes, uma construção que foge ao razoável e agride o bom senso, configurando violação aos mais elementares preceitos de moralidade pública e administrativa que a Constituição de 1988 expressamente impõe.
Sua derrisória e final mensagem é que brasileiros, sobretudo os que integram uma casta privilegiada, após banquetear-se em práticas criminosas, serão “punidos” com uma régia aposentadoria, mesmo que não preencham os requisitos legais para tanto.
Se o exemplo é bizarro, o que dizer daquele magistrado honesto que tenta, voluntariamente, aposentar-se com proventos proporcionais ou integrais? Não, este não pode. O benefício só alcança aquele que praticou ato ilícito – a juízo do próprio Tribunal ou do CNJ, depois de submetido ao amplo direito de defesa em processo legal administrativo disciplinar.
Vá explicar…
Por outro lado, ao se fazer uma comparação entre os magistrados e os demais agentes públicos, não se vislumbra idêntico tratamento ao presidente da República em caso de crime de responsabilidade (Poder Executivo), nem aos deputados e senadores, em caso de processo político-parlamentar (não judicial, portanto), muito menos aos servidores em geral – que podem ser demitidos a bem do serviço público, sem direito nenhum.
A “punição” também agride o próprio sistema contributivo de aposentadoria a que estão submetidos todos os servidores públicos, incluindo os magistrados e membros dos Tribunais de Contas. Nele estão previstas a aposentadoria por invalidez permanente, a aposentadoria compulsória (70 anos) e a aposentadoria voluntária, desde que cumpridos, ao menos, 20 anos no serviço público e 10 anos no cargo efetivo de final de carreira. Nunca, porém, a da aposentadoria compulsória com proventos proporcionais em decorrência de penalidade aplicada em processo administrativo-disciplinar.
Como se vê, manter a aposentadoria compulsória nesses casos é afirmar, em alto e bom som, que nem todos são iguais perante a lei. É indigno, injusto, imoral. Agride a isonomia contida na norma constitucional. Configura privilégio, descolado do conceito de cidadania.
Reformado e revigorado nos últimos anos, é chegada a hora de o Judiciário brasileiro provar sua maturidade e enfrentar essa questão com coragem e determinação, fazendo-nos crer que a velha e reconfortante máxima “a lei é para todos” ainda não nos abandonou. A sociedade agradece.

Fonte: Revista Prática Jurídica

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